O reconhecimento das madrastas

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Segundo Bert Hellinger e sua ciência dos relacionamentos, o primeiro grande Amor que temos, tanto mulheres quanto homens, é a mãe.

A mãe, por sua vez, abre espaço para que os filhos vejam o pai e o reconheçam como tal. Assim, filhos tomam o pai neste segundo momento.

Nos tornamos filhos inteiros, dos dois, quando reconhecemos a grandeza de ambos: da mãe e do pai. Um amor incondicional que nos entregou a vida, num movimento que nunca teremos capacidade de, a eles próprios, retribuir na mesma proporção.

ELECTRA E SEU AMOR IMPOSSÍVEL

Mais tarde, a psique das meninas amadurece quando vivem o amor pelo pai. Para as meninas, esta fase passeia pelo arquétipo de Electra – figura mitológica que se apaixona pelo pai. Algo que acontece naturalmente nas meninas que, com o passar do tempo, se frustram ao diferenciar o amor de homem-esposa, do amor de pai-filha.

E quando esta diferenciação não se completa e se expressa por períodos longos, até a vida adulta da mulher? É fundamental que a filha se deixe frustrar pela sexualidade da mãe, a grande, que lhe diz, implicitamente, em modernas palavras: “Este homem, seu pai, tem dona: eu, sua mãe. Inspire-se em mim e encontre, você, o seu próprio homem”.

Eu me torno mulher quando reconheço a sexualidade da minha mãe e, sob a perspectiva da minha própria existência, eu a vejo como a única e a melhor mulher para meu pai (mesmo que já tenham se separado e estejam em outras relações): “Mamãe, você é melhor mulher para o papai. Diante desta relação, eu sou a pequena, a filha deste encontro”.

Este reconhecimento me retira do lugar infantil de uma relação com este homem impossível (pai) para um homem possível, tangível – cujo amor acontece de uma nova forma: condicional e regida pelo equilíbrio. Uma nova experiência.

Mulheres que não se permitem frustrar perante a grandeza da mãe como a mulher deste homem, o pai, tendem a buscar relações impossíveis, homens indisponíveis ou vínculos afetivos parciais – sempre com um pé fora da relação.

E QUANDO ELECTRA NÃO QUER SAIR?

E quando a filha não consegue reconhecer na mãe, casada ou separada do pai, como a grande?

Quando não consegue tomar a mãe como é, e permanece em Elektra, se julgando melhor que a mãe?

Quem auxilia as meninas a completar este ciclo fundamental de frustração diante do homem impossível?

É aí que, para a sorte de algumas delas, surge a madrasta.

Essa figura tão estigmatizada, profundamente questionada desde os contos de fadas. É ela quem contribui para completar este processo de frustração diante do homem impossível (seu pai).

Na vida sexual do pai, a mãe cede lugar, e a madrasta chega para completar a frustração de Elektra, dizendo: “É isso mesmo: siga seu caminho, este homem é meu!”.

É aí que diversas disputas acontecem, pois muitas vezes as enteadas entram ainda mais fundo na ilusão de tomar o lugar da mãe, a veem ainda menor, como se as mães precisassem ser, por elas, vingadas.

As enteadas ainda não viram que, graças a esta frustração perante as escolhas da vida sexual do pai, elas ficam livres para encontrar seu próprio homem.

As madrastas são ponte para que esta frustração se complete e elas possam abrir-se ao mundo e ao novo companheiro – um homem possível, real e comum.

PEDRAS NO CAMINHO, NOVOS APRENDIZADOS

No meio do caminho, muita coisa acontece: madrastas infantilizadas buscam no marido um pai, e disputam com as enteadas o lugar de filhas, que nunca serão.

Filhas, este lugar é seu por realidade. Nada lhes tira isso. Nem mesmo seu pai pode negar o que é. Abrace o fato: você existe, é a filha e ele é o SEU pai! O resto é projeção da madrasta, uma mulher tão humana, comum, imperfeita e emaranhada quanto você. 😉

Além de buscar um pai, muitas madrastas *ainda* não conseguem tomar posse de “novas escolhidas” de seu homem, ao sentir ciúmes da esposa anterior – na própria esposa ou vendo traços dela na filha. Somente conseguirá ocupar seu lugar de segunda, ao olhar com profundo respeito para a primeira mulher, ver a sua dor e agradecer o fato de esta ter cedido lugar ao lado deste homem, em seu favor.

Ainda assim, mesmo com essas pedras do caminho, *as filhas são frustradas deste amor impossível graças a esta mulher*, e tomarão posse de imensas forças quando reconhecerem este serviço prestado pelas madrastas.

Eu agradeço às mulheres fortes da minha vida: minha mãe e, posteriormente, minha madrasta que – felizmente – frustram a Electra em mim. Assim, posso estar cada vez mais consciente de suas grandezas, e livre para, como elas, também ser mulher, grande em meu lugar, e me entregar, cada vez mais, ao homem que escolho para estar ao meu lado.

Gratidão, hoje e sempre, às mães e às madrastas!

PS 1: Aos filhos homens, as madrastas auxiliam a observar o pai ser e tornar-se homem, estando presente numa nova relação. Assim como os padrastos servem da mesma forma às filhas mulheres.

PS 2: Aos homens e seus complexos de Édipo, qual papel dos padrastos em suas vidas? Convido-os a refletir de seu lugar.

(Texto revisado em 11 de julho de 2021)

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